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O Último Fenício V



Capítulo V

   Nikola Koen recebeu uma educação esmerada e por causa do ofício exercido a partir dos quinze anos, aprendeu diversas línguas do Velho Continente. Entendia o francês, o inglês, o grego, espanhol, algo do português, alemão, além do hebraico. Viajou por muitas cidades européias negociando os tecidos fornecidos por seu avô e, em passagem por Viena, por motivo de cobrança a um comprador recalcitrante, passou diante de um salão cuja placa em sua entrada dizia haver ali apresentações de outro mundo. O jovem sempre fora perscrutador, interessado nas ciências e vivia às voltas com livros de História, Botânica, Cabala, Alquimia e tudo o mais que havia na pequena biblioteca de Ivo Koen. Portanto, o anúncio chamara a sua atenção e logo adquiriu um ingresso para ver o que tinha ali de tão extraordinário. Vários assentos de madeira estavam voltados para um tablado, em cima do qual havia uma mesa e cinco cadeiras. Quase todos os lugares estavam ocupados e, por sorte, Nikola conseguiu sentar-se na primeira fila. Em seguida, um homem alto, de cabeleira negra revolta, aparentando aproximar-se dos trinta, fez sua entrada e, dirigindo-se ao público, falou:
-Senhores, muito boas tardes! Trouxe-vos uma apresentação que há muito faz sucesso em salões de Paris: as mesas que giram. Hoje tereis a prova de que existe outro plano, o plano para onde pessoas, outrora habitantes desta Terra, se encaminham após a morte! Eis, senhores, a oportunidade que tendes de comunicação com entes queridos e para tanto precisarei de quatro voluntários – quem gostaria de participar?
   Três homens levantaram a mão e, após um breve silêncio, Nikola decidiu-se participar também daquela demonstração. Sentaram-se em redor da mesa circular e repousaram suas mãos abertas sobre a superfície. O diretor da sessão fez algumas invocações – talvez o apoio de voluntários servisse para demonstrar a autenticidade das manifestações; a mesa não se moveu nos primeiros vinte minutos. Quando, enfim, fez um leve movimento, Nikola sentiu um mal-estar e seu corpo estremeceu de modo a atirá-lo ao solo, como em um ataque de epilepsia - perdeu os sentidos. Despertou passado um quarto de hora quando lhe deram alguma substância para inalar.
-O senhor está bem? – Perguntou o que dirigira a sessão.
-Eu... Eu estou... O que houve?
-O senhor teve um ataque dos nervos. Bem, eu não chamaria assim depois do que vi...
-Quem é o senhor? – Perguntou Nikola tentando firmar as vistas.
-Sou Maurice Corbeau, magnetizador. É um prazer conhecer alguém com o seu dom! Foi uma materialização impressionante!
-Materialização?
-Sim, o senhor desmaiou e começou a expelir ectoplasma; mas não durou muito tempo, o suficiente para vermos, admirados, um rosto feminino formar-se no ar!
   Este breve episódio deu-se sete anos antes, em 1864, e dali os dois partiram por toda a Europa. Nikola confessou a Maurice que, desde tenra idade, via e ouvia coisas dentro de casa, tinha sonhos misteriosos, mas que nunca ocorrera algo semelhante com ele anteriormente. Maurice o convenceu que isso merecia ser melhor explorado, que um dom desses jamais poderia passar despercebido aos olhos do mundo e que se tinha muito a ganhar. De fato, as apresentações renderam mais, pois muitos queriam pagar para ver Nikola materializando, movendo objetos com a força do pensamento e até flutuando; e tais sessões, com durações variadas de uma a seis horas, exauriam o jovem profundamente. Maurice, que se congratulava pela descoberta, procurava tirar o sumo dos dons de Nikola, porquanto a promessa de fortuna era certa. Ivo Koen, em Belgrado, não aprovava a nova carreira do neto e quis que retornasse imediatamente. Porém, ele se deixara seduzir pela fama ora angariada, muito embora contrastasse com sua personalidade – o fascínio de suas habilidades agora descobertas, exerceram-lhe forte impressão.
   De 1864 ao ano de 1868 passaram assim, de cidade em cidade, estampando alguns jornais e revistas científicas, sendo alvo de descrédito, escárnio e perseguição. Não obstante, lograram o reconhecimento da multidão de curiosos que se assomava na entrada dos locais das sessões. Foi quando receberam um convite inesperado de um ilustre expectador – apresentarem-se à corte austríaca no Palácio de Schoenbrunn. O Conde de ***, autor do convite, de gênio impressionável e místico; velho e ignorado pelos seus pares, desejava vê-los reproduzir os fenômenos para o Imperador e prová-lo que nada daquilo era mentira. Nikola a princípio recusou; Maurice, contudo, empolgou-se com a notícia e de vistas na grandiosidade da ocasião, pensou, em sua ilusão megalômana, em possíveis títulos de nobreza.
   Foi no final de Novembro, em noite fria; Maurice e Nikola fizeram seu espetáculo para uma platéia seleta em uma das alas do Palácio. O judeu, magnetizado pelo francês, fazia adivinhações como o nome da esposa de não sei que ascendente de um nobre dali e qual as circunstâncias de sua morte; onde estavam guardados a carta, o anel, a caixa, etc; movia objetos e flutuava a milímetros do chão. Os presentes aplaudiam mais a um truque de mágica do que a manifestações mediúnicas. Uma pessoa, porém, ficou sensivelmente admirada e deu seus sinceros cumprimentos a ambos: era Amália, uma condessa de dezoito anos, de compleição diáfana e pele alva similar à porcelana; olhos grandes e azuis, cabelos negros, presos em fino toucado – uma bela princesa de traços marcantes e expressivos. Em curto período, Amália se envolveu nas sessões. Vestia-se com as roupas de alguma criada para escapar incógnita e assistir Maurice e Nikola. Tomada de certo encantamento, apaixonou-se pelo judeu. Mas Amália estava prometida a um oficial de alta estirpe da Hungria...

Continua...

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